terça-feira, 22 de novembro de 2016

Leituras

Durante os últimos anos, o conceito de transparência teve uma carreira meteórica nas nossas sociedades democráticas. A observação do poder apresenta-se como o grande instrumento de controlo cidadão e de regeneração democrática. Ora bem, como qualquer outro princípio político, tem de ser promovido e equilibrado com outros instrumentos. Convém que o entusiasmo pela transparência não nos esconda as dificuldades inerentes ao seu verdadeiro exercício, bem como os seus inconvenientes e os seus possíveis efeitos secundários, assim como o jogo de ocultações que pode promover. Além de observar, os cidadãos devem dispor de outras capacidades igualmente essenciais para a democracia. Se atendermos a todas as variáveis que intervêm na sociedade democrática podemos afirmar que a transparência é um valor que deve ser promovido na sua justa medida, tão necessário como limitado, que uma democracia requer transparência mas não a suporta em excesso nem a pode erigir como princípio único. As nossa democracias oculares articulam-se em torno da observação do combate que as suas elites travam, e na observação desse espetáculo radica tanto a força do seu controlo como as limitações da transparência.

Daniel Innerarity, A Política em Tempos de Indignação, pag. 283