Durante os últimos anos, o conceito
de transparência teve uma carreira meteórica nas nossas sociedades
democráticas. A observação do poder apresenta-se como o grande instrumento de
controlo cidadão e de regeneração democrática. Ora bem, como qualquer outro
princípio político, tem de ser promovido e equilibrado com outros instrumentos.
Convém que o entusiasmo pela transparência não nos esconda as dificuldades
inerentes ao seu verdadeiro exercício, bem como os seus inconvenientes e os
seus possíveis efeitos secundários, assim como o jogo de ocultações que pode
promover. Além de observar, os cidadãos devem dispor de outras capacidades
igualmente essenciais para a democracia. Se atendermos a todas as variáveis que
intervêm na sociedade democrática podemos afirmar que a transparência é um
valor que deve ser promovido na sua justa medida, tão necessário como limitado,
que uma democracia requer transparência mas não a suporta em excesso nem a pode
erigir como princípio único. As nossa democracias oculares articulam-se em
torno da observação do combate que as suas elites travam, e na observação desse
espetáculo radica tanto a força do seu controlo como as limitações da
transparência.
Daniel Innerarity, A Política em Tempos de
Indignação, pag. 283