sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Leituras


Avenida 5 de Outubro
O nascimento da república. O meu avô está lá. De pé ao cimo da avenida. Os olhos abertos para o futuro. Está de pé e treme no lado ocidental da barricada, construída por ele (por todos nós) com bancos arrancados da rua. Cai-lhe m chapéu para a testa ancestral. Cai-lhe um bigode para os lábios históricos. Ao fundo da espingarda começam os seus olhos. Graves, cor de maçã. Em Trieste, ao mesmo tempo, sem nada saber, James Joyce escreve «Dubliners», num pequeno café, cuja primeira edição há-de ser queimada por um desconhecido.
O meu avô está triste porque dali não pode ver o Tejo (minha avó engoliu o Tejo). Mas Novélia dobrou agora a esquina. Vem aí. Desculpe, avô. Novélia: um vestido vermelho e um guarda-chuva com a cabeça de um cão na ponta. Um dia hás-de vir comigo avô ouvi-la falar dos ratos que ele cria e que vêm da Índia em barcos e que lhe sobem os sorrisos. A um rato, o maior, chama-lhe Vasco da Gama.

(pag. 25)

Leituras


Só uma perversão do espírito pode atribuir significado a um juízo deste tipo: Platão está ultrapassado, Goethe está ultrapassado. Tal como se tratasse de modelos Ford e não de personalidades únicas, irredutíveis, criadoras de verdade e de beleza cujo caminho tem de ser sempre de novo percorrido por cada homem que ascende à consciência do verdadeiramente humano, ainda que os não conheça.

(pag. 75)

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Da indiferença e da indigência

Esta notícia e esta dão a medida moral da Nação. Entre uma carteira que não é devolvida e um termo de identidade e residência que não é cumprido, a diferença moral não existe. Talvez exista a indigência da cumplicidade.

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Os outros

Nunca ouvi ninguém dizer que vivia acima dos seus direitos. Quem vive acima dos direitos, obviamente, são os outros; é o que se pode concluir. É este discurso, difuso e interiorizado, que leva à desagregação social, à morte lenta da solidariedade. Mas não haja ilusões: também sustenta um projeto político.

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

José Sócrates e o inglês

Não sei se José  Sócrates fala e/ou escreve bem ou menos bem o inglês. O que sei é que tem feito pelo inglês o que o futuro exige. A sua intervenção televisiva no domingo passado, ainda que em português, foi gramaticalmente correta e politicamente eficaz.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

O prestígio

"- Neste país em diminutivo...
  - Respeitinho é que é preciso!"
 
Alexandre O`Neill

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

A crise

Foi em setembro de 2008 que a crise, a financeira, se abateu pelo mundo. É hoje óbvio que a crise, ainda que vivêssemos abaixo dos nossos sonhos, não deixaria de atingir Portugal. Mesmo sem melhores estradas, ou melhores escolas, ou melhores hospitais, não escaparíamos à voracidade de mecanismos financeiros sem regras e sem moral. O futuro não se constrói mentindo sobre o passado.

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

O inglês

Parece que também no inglês vivíamos acima das nossas possibilidades. A solução é igual a tantas outras: corta-se nos anos de aprendizagem. Na semântica dos direitos, cortar, até há bem pouco, era um verbo improvável. Hoje, tornou-se um destino.

domingo, 15 de setembro de 2013

Realidade ou perceção?

Onde está a crise da justiça? Na sua realidade ou na sua perceção? Pedro Magalhães, a propósito do discurso da tomada de posse do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, contabiliza os números e conclui pela realidade.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Segurança Interna


Estabelece o artigo 1º, n. 3, da Lei de Segurança Interna (Lei 53/2008, de 29 de Agosto), que "as medidas previstas na presente lei destinam-se, em especial, a proteger a vida e a integridade das pessoas, a paz pública e a ordem democrática, designadamente contra o terrorismo, a criminalidade violenta ou altamente organizada, a sabotagem e a espionagem, a prevenir e reagir a acidentes graves ou catástrofes, a defender o ambiente e a preservar a saúde pública."
No artigo 25º da mesma Lei, estatui-se que a Polícia Judiciária exerce funções de segurança interna, e no artigo 12º que o director nacional da mesma integra o Conselho Superior de Segurança Interna.
É, por isso, estranho que se possa justificar, como o fez a Senhora Ministra da Justiça, a ausência da Polícia Judiciária no Grupo de Reflexão Estratégico em Segurança  Interna dado que este Grupo tratará de questões relacionadas com a segurança e a PJ ser "sobretudo uma polícia de investigação criminal."

domingo, 8 de setembro de 2013

Tendência, tentação

C’è un forte contrasto tra il profondo sen­so di giustizia che tutti, anche i mal­vagi, ci ritroviamo dentro, e il mondo che ci appare come uno spettacolo di generalizza­ta ingiustizia. «L’uomo nasce libero, ed è o­vunque in catene» (J.J. Rousseau). Per molte ingiustizie i tribunali e gli avvocati non ba­stano, per alcune non servono, perché gli a­spetti legali, commutativi e compensabili co­prono solo una piccola parte del territorio della giustizia, la cui estensione coincide con quella dell’intera vita in comune. Un modo sbagliato di rispondere alla domanda di giu­stizia è la tendenza, oggi in veloce aumento, a 'giuridicizzare' l’intera vita sociale, codifi­cando possibilmente ogni relazione inter­personale, trasformando tutti i rapporti u­mani in contratti. Una tendenza-tentazione che, invece di aumentare la giustizia, sta bloc­cando scuole, condomini, ospedali in trap­pole di sfiducia reciproca, poiché molti rap­porti umani si snaturano quando vengono contrattualizzati.

Luigino Bruni