segunda-feira, 27 de junho de 2022

O SEF ainda existe?

No JN de ontem, destacava-se a existência de milhares de imigrantes com vidas suspensas à espera do SEF.
Há dias,  o DN noticiava que o SEF tem 23 bases de dados e a PJ não tem acesso a nenhuma.
A incapacidade para dar cumprimento à extinção do SEF tornou-se caricatural. Havendo serviços para enquadrar todas as atribuições que pertencem a esta entidade, torna-se difícil entender as razões pelas quais mais um propósito político se transformou numa novela.

quinta-feira, 23 de junho de 2022

A diabolização dos recursos

Em 15 de dezembro de 2011, com o título Atrasos, recursos, escrevi o texto que transcrevo:
"Algo está mal na nossa justiça, quando permite tantos atrasos e recursos." É o que se escreve, hoje, no Público, a propósito do Caso Isaltino. A confusão entre atrasos e recursos era o que não esperaria de um jornal que se quer de referência. Os atrasos são sempre de quem os pode ter e se há quem os não possa ter são os arguidos. Os recursos não põem em causa a eficiência da justiça; são um instrumento essencial para que ela, a justiça, possa ser menos injusta. Ou dito de outro modo, mais justa.
Esta ideia persistente de que os recursos são a causa e não a consequência de uma justiça deficiente e incapaz de responder em tempo razoável, é civicamente perigosa. Aliás, está ligada a uma outra diabolização: a dos advogados.
Sobre estes escrevi, em 24 de novembro de 2011, com o título Manobras dilatórias, o texto que transcrevo:
De repente, a expressão ganhou foros de atualidade e tornou-se arma de arremesso contra a advocacia. O que é obviamente injusto. Os advogados cumprem prazos no interesse dos seus representados, e, quando os não cumprem, estes, os seus representados, sofrem as consequências. Insinuar que as prescrições do procedimento criminal são obra demoníaca dos advogados, por conta das fortunas que ganham, é uma injúria. As prescrições acontecem quando quem, tendo a obrigação de cumprir prazos, não os cumpre e desse incumprimento não resulta nenhuma consequência.
É preciso continuar a dizê-lo: os recursos são uma aquisição civilizacional e a advocacia é um pilar fundamental da justiça.

quarta-feira, 22 de junho de 2022

CAIDJCV

Segundo o DN, os ministros da Administração Interna, da Justiça, da Educação, do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e da Saúde assinaram um despacho conjunto que cria a Comissão de Análise Integrada da Delinquência Juvenil e da Criminalidade Violenta.
Integrando 14 elementos, este miniparlamento tem como principal objetivo a apresentação, no prazo de um ano, de propostas que visem a diminuição da delinquência juvenil e da criminalidade, em particular da sua severidade.
Não deixa de ser estranho que não integre a dita Comissão nenhum elemento do Ministério Público, quer na vertente da justiça dos menores, quer na vertente da justiça penal.
Por outro lado, conhecendo-se a urgência da situação, pode politicamente descansar-se sem a tomada de medidas a muito curto prazo, de pendor preventivo, que resultem da capacidade de auto-organização das diversas entidades locais, nomeadamente daquelas que cobrem as áreas geográficas mais críticas?

segunda-feira, 13 de junho de 2022

Ler a decisão

Destaca o Jornal de Notícias na sua edição de hoje:
O Tribunal da Relação de Évora acaba de reduzir e suspender a pena de prisão efetiva aplicada pelo Tribunal de Setúbal a um professor de inglês, por entender que as carícias que este fez a alunas de sete anos, por debaixo das suas roupas, têm "cariz sexual", mas não constituem crime de abuso sexual.
Esta notícia tem suscitado uma indignação generalizada.
O acórdão pode e deve ser lido aqui.

Leituras



Começou por revogar todas as leis de Drácone*, excepto as que se referiam ao homicídio; excessivamente severas nas punições, só pronunciavam uma pena para todas as faltas: era a pena de morte. Os que eram acusados de ociosidade, os que apenas tinham roubado legumes ou frutos, eram punidos com o mesmo rigor que os sacrílegos e os homicidas.
Também, mais tarde, Démado dizia, com razão, que Drácone tinha escrito as suas leis, não com tinta, mas com sangue. Quando se perguntava a este legislador porque tinha estabelecido a pena de morte para todas as faltas, ele respondia: «Acho que as menores faltas merecem essa pena e não encontrei outra para as grandes».

*A legislação de Drácone foi promulgada cerca de 624 a.J.C; e a de Sólon, no ano de 593.

Pags. 40/41

sexta-feira, 10 de junho de 2022

Pinto Monteiro (1942-2022)

Como procurador-geral da República, e é enquanto tal que o posso testemunhar, Pinto Monteiro deu o melhor que soube num contexto que lhe foi, manifestamente, hostil.
À diabolização sindical e corporativa juntou-se o boicote do Conselho Superior do Ministério Público, paralisando, com êxito, os propósitos que pudesse ter tido.
De uma integridade antiga e de uma boa disposição natural, o acidente funcional que lhe calhou foi-lhe profundamente injusto.
É curioso, ou talvez não, que a comunicação populista não o tenha esquecido nem perdoado.

quinta-feira, 2 de junho de 2022

A comissão 3

A comissão que investiga os abusos de natureza sexual no âmbito da Igreja Católica encontra-se em atividade há meses. Apesar disso, existe um imbróglio no que respeita às consultas dos diversos arquivos eclesiásticos, diligências obviamente importantes para a investigação.
Não deixa de ser insólito que a comissão tivesse iniciado as suas funções sem ter garantido a possibilidade de acessos aos arquivos, o que desde o seu início se deveria configurar como necessário e plausível.