sábado, 3 de novembro de 2018

Leituras

A pena aplicada pela Alçada a Gravito, Francisco Silverio, Clemente da Silva Melo Soares de Freitas e Manuel Luiz Nogueira foi igual. Foram todos condenados a serem levados com baraço e pregão pelas ruas do Porto até à Praça Nova, e ahi enforcados, sendo-lhes em seguida cortadas as cabeças para serem postas no lugar do delicto.
No dia 7 de Maio de 1829, pelas 10 horas da manhã, sairam da Relação com mais seis companheiros condenados também à morte, além de outros condenados a assistir às execuções, em cujo numero se contava o corregedor de Aveiro Francisco Antonio de Abreu e Lima, e levados com o habitual acompanhamento, do qual faziam parte as tumbas da Misericordia, que haviam de receber os cadaveres, pela Porta do Olival, calçada dos Clerigos e largo dos Loios à Praça Nova, onde em duas forcas levantadas sobre os alicerces do monumento comemorativo da revolução de 24 de Agosto de 1820, o tristemente celebre João Branco e outro algoz deram cumprimento à execranda sentença.
Tres horas depois estava tudo terminado. Os cadaveres decapitados foram levados, pela irmandade da Misericordia, para o «Adro dos Enforcados», na rua hoje chamada da Liberdade, onde o coveiro Joaquim Manuel lhe deu sepultura, sendo mais tarde exumados e trasladados para outro lugar, como teremos ocasião de dizer. As quatro cabeças essas ficaram no patibulo até ao dia seguinte em que o algoz João Branco, acompanhado pelo «Meirinho das cabeças», as foi buscar e metendo-as num saco de couro marchou com elas para a Vila da Feira e Ovar, donde veiu em barco para esta cidade no meio de forte escolta de infanteria e cavalaria que o custodiava. A cabeça de Clemente de Melo ficou na Vila da Feira, sendo ali pregada num alto poste pelo carrasco. A Aveiro chegaram os tristes despojos na madrugada de 10 de Maio, sendo o algoz recolhido na cadeia.
A noticia correu veloz e, num momento, a maior parte das janelas e portas de muitas habitações foram cerradas em sinal de luto. Esta demonstração compreendeu quasi a toda a cidade, pois estendeu-se mesmo a muitas casas de pessoas afectas ao governo de D. Miguel. As instruções vindas do Porto eram que a cabeça de Francisco Silverio fosse colocada junto ao pelourinho (era no largo do Rocio em frente da rua da Rainha e que no seculo XVII tinha o nome de rua de Venesa), a de Gravito em frente da casa da camara e de Manuel Luiz Nogueira, defronte do convento do Carmo.
As autoridades a quem tocava dar cumprimento a esta ordem, viram-se porém em serios embaraços, pela dificuldade de encontrara quem fornecesse os postes necessarios e os colocasse nos mencionados locais. Gastou se todo o dia nestas diligencias, até que no dia seguinte o juiz de fóra fez prender diferentes lavradores do lugar de Azurva, a quem obrigou a trazer os pinheiros necesarios, e alguns carpinteiros que violentadissimos os ergueram nos locais designados, depois do algoz ter colocado em dada um deles uma das cabeças segura por um grande prego. A esta medonha selvageria assistiram tripudiantes alguns miguelistas mais exaltados e bastante gentalha vinda em grande parte dos lugares visinhos, que aplaudiu o carrasco quando este, procurando ageitar a cabeça do infeliz Gravito, lhe dirigiu umas graçolas soezes como no-lo afirmou uma testemunha ocular.

(pags. 55/57)