Há poucos sítios que despertem tanta indiferença a uma sociedade como as prisões: poucos querem saber como se trata quem lá está, tornando-se facilmente um território de ninguém. Quem é encarcerado tal altas probabilidades de ser dupla e triplamente punido, de cumprir uma pena para a vida, mesmo quando já está fora das grades.
Na prisão - estudaram-no vários autores, como Michel Foucault - o regime de retaliação enclausura também os nossos medos, os nossos grandes fantasmas, as nossas inseguranças enquanto sociedade. Quanto mais tempo aqueles que elegemos como inimigos lá ficarem, melhor.
Não espanta, por isso, que quem visite os estabelecimentos prisionais em Portugal, em particular os que estão em zonas onde há um maior número de afrodescendentes, veja sobretudo população negra, em enorme desproporção quanto à sua representatividade social. Ainda recentemente (Fevereiro de 2018), o Comité Anti-Tortura do Conselho da Europa afirmou que Portugal está no topo dos países da Europa Ocidental com maior número de casos de violência policial, e que o risco de abusos é maior para afrodescendentes portugueses e estrangeiros - ou seja, aquele organismo reconhece que há discriminação racial por parte das forças de segurança.
Quando comecei a fazer este trabalho sobre o racismo em Portugal pensei de imediato no sistema de Justiça, abrangendo desde a polícia aos tribunais, justamente porque imaginava que o resultado da investigação iria tornar a gerida mais visível. Só não achei que fosse tão profunda.
(pags 25/26)