É uma instituição de centénios, muito velha e sempre nova, lugar de inculcações e manobras, sítio de discursos utópicos, espaço de ideologias, o cais de coletivas esperanças, futuro. É uma invenção europeia que o Mundo tem adotado. Desde o seu aparecimento nesse longínquo século XII ibérico nunca se lhe recriminou o existir - como, por exemplo, às Universidades também não. O que se lhe tem recriminado muitas vezes, ontem e hoje, aqui e noutros lugares, são os modos como tem existido. As Cortes e os Parlamentos são bem a instituição que distingue, no seu deve e haver liberdade, as épocas e as políticas. Os moderníssimos sinais dos tempos, neste encenar de milénio, parecem augurar para a Instituição, em todo o Mundo, o papel formidável de conciliar vontades plurais, de homologar os destinos genuinamente democráticos de povos e nações e de garantir no diálogo o encaminhamento do Planeta para a tolerância, a paz e o progresso. Assim seja - que em História a previsão é palavra proibida.
As Cortes Portuguesas da Idade Média - que eu tenho insistido, apesar de vozes discordantes, em designar de Parlamento Medieval Português - tiveram a sua origem durante o século XIII, provavelmente antes de 1254, antes ainda do celebrado Parlamento Inglês. Foram grandes Assembleias Representativas da Nação, onde a voz do Povo, mais do que a do Clero e a da Nobreza, se fez ouvir e se impôs. Entre 1254 e 1495 reuniram pelo menos setenta e seis vezes, em Braga, Guimarães, Porto, Coimbra, Guarda, Viseu, Leiria, Torres Vedras, Torres Novas, Santarém, Lisboa, Elvas, Estremoz, Montemor-o-Novo, Évora e Viana do Alentejo. Leis, acordos, tratados, regimentos, decisões tributárias, protestos políticos, reformas gerais, declarações de guerra e paz, questões de soberania nacional - tudo se fez nessas assembleias. Textos e textos se produziram, milhares deles, um corpus documental vastíssimo ainda quase todo inédito. E nenhum é supérfluo para a História que se faz e haja de fazer-se sobra a Idade Média de Portugal.
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Este texto faz parte da Conferência proferida na cerimónia de abertura do ano lectivo de 1990/1991, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, em 22 de outubro de 1990.
Sobre o Professor Armindo de Sousa, consultar aqui.