segunda-feira, 30 de setembro de 2024

Falácia

No último semanário Expresso, para defender que o número de escutas telefónicas realizadas não seria excessivo, o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público sustentou que esse número não seria superior a pouco menos do que 2% do total de inquéritos. Creio que estaria a reportar-se a números de 2023.
Esta percentagem induz o leitor a engano dado que faz pressupor que em todos os inquéritos a utilização desse meio de obtenção de prova seria possível. E não o é.
A lei condiciona significativamente os casos em que as escutas telefónicas se podem realizar. Por isso mesmo, o valor dessa percentagem só terá significado com referência, não ao número total de inquéritos, mas apenas ao número de inquéritos passíveis dessa utilização.

domingo, 29 de setembro de 2024

Fraca memória

Já não se devem lembrar da guerra que fizeram ao procurador-geral da República, Pinto Monteiro, pelo facto do seu vice-procurador-geral da República, Mário Dias Gomes, ir atingir a idade de 70 anos no exercício daquelas funções e nelas pretender continuar.
A guerra foi tão persistente que obrigou à cessação de funções deste e levou Pinto Monteiro a, contra a sua vontade, propor um novo vice-procurador-geral da República.

sábado, 28 de setembro de 2024

Nota política

Nas sucessivas nomeações de procuradores-gerais da República, o PSD mostrou-se, politicamente, mais eficaz do que o PS.

quinta-feira, 26 de setembro de 2024

A ler

Les modes alternatifs de résolution des conflits sous l’empire de l’ordonnance criminelle : la loi et la doctrine




Resumo:
Au cours de l’été 1670, la commission en charge de la rédaction de l’ordonnance criminelle – qui sera promulguée quelques semaines plus tard – se réunit pour son ultime conférence. La séance du jour est notamment dédiée à l’examen de trois articles consacrés aux différents modes de résolution des litiges, amiables et judiciaires. Le projet initial se veut restrictif en interdisant les transactions au « grand criminel » tout en les autorisant en revanche dans les autres cas. Les parquets ont même l’interdiction de poursuivre dans cette dernière hypothèse, la voie amiable se voit ainsi renforcée au petit criminel. Les échanges entre les membres de la commission conduisent même ces derniers à élargir le champ des transactions et des cessions de droit en les autorisant pour tous crimes, y compris les « crimes capitaux ou auxquels il écherra peine afflictive » dans la mesure où les procureurs ont l’obligation de poursuivre dans cette hypothèse. Toutefois le nouvel article 19 du titre XXV de l’ordonnance ne précise pas ce qu’il entend par « crime capital » et ouvre ainsi la voie à un contentieux. La doctrine quant à elle se montre bien plus restrictive que le texte et en restreint le domaine d’application.

segunda-feira, 23 de setembro de 2024

Um exemplo: à tragédia da vida junta-se o drama da justiça

"A Maria morreu, alegadamente por negligência médica, num Hospital público, ao dar à luz a segunda filha.
A bebé sobreviveu. O António ficou viúvo com as duas filhas.
Procurou que se fizesse justiça e deu entrada com uma ação no Tribunal Administrativo.
Passaram 14 anos e o processo ainda nem tem audiência prévia marcada.
Por este andar vão passar outros tantos anos até que conheça a sentença definitiva sobre o trágico acontecimento que lhe revirou a vida."

Do artigo de Mónica Quintela, O ´Manifesto 50´: da vida das pessoas, no Diário de Notícias

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

O(a) novo(a) procuradora(a)-geral da República

Não irá resolver os problemas da justiça, mas, ainda que não sendo fácil, poderá contribuir.
A gestão do Ministério Público é partilhada pelo procurador-geral da República e pelo Conselho Superior do Ministério Público. Sendo o Conselho uma assembleia de membros com proveniências diversas e com diversas agendas, a convivência entre estas duas cabeças não é fácil, como a história o ilustra.
Naturalmente, como acontece em assembleias, a tendência será a de formação de maiorias, eventualmente de bloqueio, como também a história o ilustra.
Será óbvio concluir que a afirmação da autoridade do procurador-geral que agora se reclama não tem um contexto institucional que a este seja favorável.
Um procurador-geral de consenso será aquele que se venha a enquadrar com a maioria que se venha a formar, o que mais uma vez a história corrobora.

terça-feira, 17 de setembro de 2024

Sobre as prisões

"As prisões portuguesas são instituições cruéis, assustadoras, anacrónicas, medievais, medonhas, arcaicas, degradantes, ineficazes, violentas, desumanas e dispendiosas. Esta é a constatação a que chego com os muitos anos de voluntariado prisional, confirmada pelos relatórios de várias instâncias nacionais e internacionais (Comité contra a Tortura do Conselho da Europa, Mecanismo Nacional de Prevenção da Provedoria de Justiça, Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, etc…)."

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Escutas, para que vos quero

Saber em quantos inquéritos foram realizadas escutas telefónicas* é importante e, também não deixa de ser relevante, quantos os visados nessas escutas. Mas a informação torna-se pouco significativa se não se souber o que foi (des)feito com as ditas.
Quantos inquéritos em que havendo escutas foram arquivados? Em quanto inquéritos, havendo escutas, foi deduzida acusação? Destes últimos, quantas as condenações?
Para a aritmética das escutas, não poderá descartar-se a natureza dos factos a investigar nem a entidade que toma a inciativa.
O lado obscuro que envolve as escutas sempre foi uma preocupação que tive ao longo da minha vida profissional, ainda que reconheça que sem sucesso. A ausência de qualquer controlo hierárquico e a inexistência de qualquer protocolo de procedimentos numa área tão próxima da devassa há muito que deveria ter sido reconhecida e ultrapassada.

terça-feira, 10 de setembro de 2024

Prisões

Seis reclusos evadiram-se de uma prisão portuguesa que está envolvida por um muro de vários metros. Dois são portugueses e três estrangeiros. As autoridades sustentaram o pânico, o comentariado indignou-se, o governo espera por oportunidade para dizer de sua justiça, e a oposição quer passar despercebida.
Portugal já foi condenado pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos por causa das condições indignas a que os presos são sujeitos. Sobre o assunto, autoridades, comentariado, governo, qual ele fosse, e oposição, qual ela fosse, mantiveram um prudente silêncio.
A moeda é a mesma, o que difere são as faces.

segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Direito e Justiça

Entrei numa livraria especializada em livros de direito e dei uma volta pelas estantes; há muito que o não fazia. Continuam a abundar na diversidade temática e na multiplicidade dos autores. Perante tanto direito, a crise da justiça terá também algo a ver com um direito em excesso? Ou será que na complexidade da vida a justiça precisa de outras artes e novos discursos?
A formação monocórdica e ensimesmada dos agentes da justiça está ultrapassada. Não cria proximidade, desresponsabiliza e é ilegível.