quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

O desvalor da liberdade

Há uns dias, numa série televisiva transmitida na RTP2, o juiz, ao proferir a sentença que absolveu o arguido a quem era imputado a prática de um crime de homicídio voluntário, decidiu também, de imediato, fixar o valor da indemnização que era devida àquele arguido pelo tempo de prisão preventiva em que se tinha encontrado. Pareceu-me ser uma boa solução para uma justiça digna.
Em Portugal, um arguido pode vir a ser indemnizado, após uma absolvição ou uma não pronúncia, pela prisão preventiva que sofreu. Para tanto, precisa de intentar uma ação contra o Estado para qual a lei exige apertadas razões.
Segundo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, 2 de fevereiro de 2023, "nem a Constituição nem a lei impõe o dever de indemnizar todo e qualquer arguido absolvido, ou que não tenha chegado a ser pronunciado, a quem anteriormente tenha sido aplicada a medida de prisão preventiva."
Pode ler-se no mesmo acórdão que "para haver lugar condenação do Estado a indemnizar por prisão preventiva, em ação declarativa própria, o autor carece de demonstrar que se verifica uma qualquer das hipóteses tipificadas no artº 225, nº 1, do CPPenal."
Mesmo para quem não seja jurista, a leitura do artigo 225º do Código de Processo Penal é esclarecedora sobre as dificuldades que são colocadas ao arguido. No limite do absurdo, é a exigência que consta do nº 2 do mesmo artigo ao determinar que "o dever de indemnizar cessa se o arguido tiver concorrido por dolo ou negligência, para a privação da sua liberdade."
Compreende-se, assim, o número reduzido de ações em que o Estado é demandado, calando legalmente uma indignação cívica que deveria ser mais expressiva.