sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Leituras

 

ESTRANHO CASO JUDICIAL EM INGLATERRA

Em Inglaterra, como se sabe, cada arguido tem como juízes doze jurados da sua classe, cujo veredicto tem de ser unânime, e que, para que a decisão não se arraste por demasiado tempo, ficam isolados sem comida e bebida até chegarem a um consenso. Dois gentlemen, que viviam a alguma distância de Londres, envolveram-se num aceso conflito, na presença de testemunhas; um ameaçou o outro, e acrescentou que em menos de vinte e quatro horas ele iria arrepender-se do seu comportamento. Ao fim da tarde, este fidalgo foi encontrado morto a tiro; a suspeita recaiu obviamente sobre aquele que tinha proferido as ameaças contra ele. Foi detido, levado a tribunal, descobriram ainda várias provas, e 11 jurados condenaram-no à morte; só o décimo segundo teimou em não dar o seu acordo, dizendo-se convicto da sua inocência.
Os seus colegas pediram-lhe que explicasse por que razão pensava assim; mas ele nada disse, e manteve a sua opinião. Já a noite ia longa, e a fome atormentava fortemente os jurados, quando um deles se levantou e declarou que era melhor absolver um culpado do que deixar morrer à fome 11 inocentes; e assim foi redigido o indulto, embora fazendo menção das circunstâncias que haviam forçado o tribunal a essa decisão. Toda a assistência estava contra aquele único casmurro; o caso chegou mesmo à atenção do Rei, que solicitou a sua presença; o homem compareceu, e, depois de o Rei lhe ter garantido que a sua sinceridade não lhe traria consequências prejudiciais, contou ao monarca que, ao regressar um dia da caça, no meio da escuridão, disparara a sua arma, ferindo de morte, desgraçadamente, aquele fidalgo, que se encontrava atrás de um arbusto. Ora -continuou ele- como eu não tinha testemunhas nem do meu acto, nem da minha inocência, decidi guardar silêncio; mas quando ouvi dizer que um homem inocente ia ser acusado, fiz todos os possíveis para conseguir ser um dos jurados; estava firmemente decidido antes a morrer de fome do que a deixar morrer o acusado. O Rei manteve a sua palavra, e o homem foi perdoado.

(pags. 181/182)