“Algumas celas davam para o pátio. Eu podia
distinguir, às vezes, umas sombras apressadas que logo se refugiavam no escuro.
Escondiam-se, evitavam-me. Meses se passaram sem que eu conseguisse daquelas
sombras um sinal, um gesto, um murmúrio.
Fiz a minha trouxa quando, depois do meu almoço de
pão e água em serviço de prata, o sargento-mor se juntou ao vagomestre e me
comunicou num tom indecifrável entre o alegre e o contristado:- Queira preparar-se para mudar de cadeia, senhor professor.
E, para os guardas:
- Ajudem imediatamente a arrumar os pertences do senhor prisioneiro.
Pobres despojos que em dois segundos enfiei na trouxa sem precisar de apoios.
O governador esperava-me, em farda solene, com medalhas, no túnel que dava para a porta de armas. De semblante recolhido e triste, apresentou-me ao major que iria tomar conta de mim. Ligeiramente curvado, proclamou, entre outras coisas:
- É com a mais sentida mágoa que vejo partir o nosso ínclito convidado, cuja convivência honrou os meus dias e esclareceu a minha existência. Nosso major! Aqui lhe entrego o nosso distinto prisioneiro com as formalidades da lei.
Fez uma continência a que o major respondeu. Em menos de um segundo, dois soldados de farda escura algemavam-me e prendiam uma corrente ao cinturão de um deles.
Mais tarde, durante a longa viagem que se seguiu, dizia-me o major, sentado ao meu lado, com o guarda no banco de trás dum automóvel oficial:
- Quando penso que o senhor professor foi conduzido a Einladung por um tenente, não deixo de me indignar. Como foi possível? Um homem de tanta categoria implica a escolta por um oficial superior. Ainda que não seja da minha responsabilidade não posso deixar de apresentar ao senhor professor as minhas sentidas desculpas.
Quando eu lhe pedi que me retirasse as algemas ou, ao menos, me aliviasse da corrente, respondeu:
- Com certeza, senhor professor. Faz todo o sentido. É a primeira coisa que faremos ao chegar ao castelo de Verlauf.”