quarta-feira, 21 de dezembro de 2011
O avô Natal
A justiça distributiva do pai Natal é igual à dos homens. Dá sempre mais aos que mais têm. Porém, quando se descobre esta verdade, o pai Natal já não nos habita. Quando perguntei à minha Avó quem era o pai do pai Natal, ela fez-se circunspecta e insinuou que inconveniências daquelas só poderiam vir do meu Avô. Não sabendo o que eram inconveniências, fiquei com mais respeito pelo meu Avô. Afinal, antes do pai Natal, havia um homem pausado, que sabia plantar nespereiras, ainda que um pouco tonto na opinião da família. Era assim por que tinha estado na guerra, na primeira. Ter estado na guerra, naquela guerra, impunha respeito, mas também obrigava a suportar o coitado dos vizinhos. Foi no Natal a seguir às inconveniências que a verdade se tornou óbvia. Quase no fim da ceia, com a cabeça já tombada de sono, ouvi a minha Avó dizer para o meu Avô Vai lá chamar o pai Natal. A porta da cozinha, que dava para o quintal, abriu-se e o meu Avô, nas suas passadas pesadas, entrou pela noite. Com um assobio poderoso foi, com certeza, ao encontro das estrelas. Quando acordei, na primeira claridade, corri para a sala onde uma árvore decorada esperava pela minha ansiedade. Na confusão dos embrulhos que pareciam tantos, eu sabia que o meu Avô, se não era o pai do pai Natal, sem dúvida que deveriam ter estado, juntos, na guerra. Na primeira.