A partir do momento em que o racismo se torna um
tema relevante e suscitador de debates e perspectivas divergentes, torna-se
necessário interrogar a forma como os actores sociais percepcionam algumas
instituições normativas da sociedade e a relação destas com o fenómeno racismo.
A este propósito, analisou-se a percepção dos actores sobre a existência de
racismos por parte das forças policiais ou por parte da actuação dos magistrados
em situação de julgamento.
Segundo M. Wieviorka
(1992), o racismo policial resulta da confluência de factores diversos: uns de
carácter estrutural, ligados ao modo de funcionamento e à cultura da polícia
(instituição normativa), e outros de ordem mais conjuntural, determinados pela
situação social, pelas instituições e pelo sistema político. Nesta perspectiva,
os polícias não são apenas agentes que asseguram a “normalidade” do
funcionamento de uma organização social que os transcende. Assim, e apesar da
burocracia e das regras administrativas que limitam o seu trabalho, os polícias
são também actores individuais e colectivos, que exprimem a sua subjectividade,
não deixando de dispor de um certo grau de liberdade que permite a redefinição
das suas práticas. A cultura da instituição policial integra um conjunto de
normas e comportamentos estruturados quer pela identidade profissional, e
métodos de intervenção, quer pelas condições institucionais do trabalho
policial. Essa cultura parte de uma base de pressupostos mais ou menos
constantes ao longo do tempo: o sentimento de representarem o último pilar numa
sociedade em desestruturação, e o dever de constituírem uma espécie de
paliativo face às disfunções das instituições sociais, assentando a sua intervenção
num universo simbólico-ideológico estruturado com base num sistema
classificatório de alguns grupos sociais em categorias que estão sob contínua “suspeição”
– as “categorias marginais” – entre as quais se destaca a dos “ciganos”. Esta
tendência para a categorização de grupos raciais e/ou étnicos como marginais e
perigosos decorre não só das condicionantes estruturais mas também das
conjunturais, que remetem para as tensões sociais que atravessam
transversalmente as sociedades em dado momento e que têm incidências na própria
intervenção policial. (pags. 195/196)