Os magistrados, ainda que não sejam historiadores, deveriam saber que a história não se faz aos gritos. É um espaço de reflexão serena que se pode conciliar com os amores e os desamores inerentes à condição humana. Do mesmo modo, poderia dizer-se que os magistrados, não sendo sociólogos, deveriam ter preocupações sociais que lhes permitissem uma gestão mais madura, justa e eficaz das suas funções.
Nestas coisas quotidianas, não acredito em santos. Mas também não acredito em homens providenciais. O dia seguinte dos ditos homens foi sempre diluviano. É o que a história nos ensina. Apesar de não faltarem exemplos, a tentação de considerar que a culpa ou a desculpa, o êxito ou o inêxito, há-de assentar sobre os ombros de um ungido continua a fazer o seu percurso insensato.
O que sempre faltou ao Ministério Público foi uma capacidade de análise sobre o seu estatuto e sobre a sua prática. Abdicou da criatividade que a discussão permite. Não sendo criativo, permitiu-se uma ausência sistemática do sentido de iniciativa em todos os escalões da estrutura.
As reflexões históricas e sociológicas são fundamentais para se avaliar os méritos e os deméritos do que se fez e do que se poderá, melhorando, fazer. Até na medição estatística continuamos a ser deficientes. A leitura dos relatórios anuais, da primeira instância ao topo, são deprimentes. Reproduzem-se, ano para ano, em cópia de cópia.
É preciso não ter medo da história, por mais recente que ela seja. Do mesmo modo que é preciso reconhecer que o Ministério Público ainda está na adolescência das suas capacidades. Temos muito que crescer. Juntos. Ser magistrado é saber estar para além do Direito. No mínimo, estar próximo da Justiça.
In Os Cordoeiros, 2 de Fevereiro de 2004
Recordado por obra e graça do António Maria no Renascer!...